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NOTÍCIAS

Inscrições abertas para o 1º Curso de Desenho “Memória Tropeira”

Capão Bonito foi entre fins do século XVIII e a primeira metade do século XIX uma importante “estação invernada”

Por Wagner D´Antonio

TROPEIRISMO – A Divisão de Cultura de Capão Bonito está com inscrições abertas para o 1º Concurso de Desenho “Memória Tropeira”.

O concurso faz parte da programação de aniversário da cidade.

Os interesses só precisam fazer um desenho sobre a cultura, história ou tradição do tropeirismo e concorrer a troféu e certificados de participação. 

As inscrições vão até 26 de abril. 

Para se inscrever acesse este link  

https://capaobonito.sp.gov.br/1-concurso-de-desenho…/

Um pouco de históriaO “caminho para o sul”: o Vale do Parapanema na rota do tropeirismo De acordo com os estudos do Plano de Manejo do PEI (São Paulo. Fundação Florestal, 2009) há cerca de duzentos anos, a marcha pelos estreitos caminhos paulistas era feita majoritariamente a pé. 

Excluindo-se algumas áreas em que a navegação por rio figurou desde os primórdios da colonização – tal como os trechos de alagadiços existentes na bacia do Ribeira de Iguape, que tinham nos portos de Iguape e Cananéia suas principais saídas para o Atlântico – a navegação fluvial constituiu exceção em São Paulo entre os séculos XVI e XVII. 

A própria navegação pelo rio Tietê, que eventualmente havia sido feita durante esse período só consolidou-se de fato depois de transcorrida a primeira década do século XVIII, quando as monções do Cuiabá estabeleceram um sistema de comunicação regular com o Mato Grosso (Holanda, 1995). 

A locomoção por tração animal também representou, até as primeiras décadas do século XVIII, uma atividade de difícil execução em São Paulo. Não obstante as sucessivas tentativas dos sertanistas em incorporar mulas e cavalos nas suas expedições ao interior, as vicissitudes típicas das jornadas pelos sertões retardaram a inclusão definitiva desses animais no sistema de transportes paulista. 

O exemplo de Bartolomeu Bueno é emblemático. Em 1722 o sertanista ficou com apenas 5 dos 38 cavalos que o acompanharam a Goiás (Holanda, 2005). Eram de toda sorte os empecilhos à implementação de um sistema definitivo de locomoção animal. Em primeiro lugar, a estreiteza e precariedade das estradas impossibilitavam que os animais se movessem de forma apropriada. Construída para a passagem de pedestres, a maioria das estradas apresentava escadas nos lugares mais íngremes. 

Ademais, as cavalgaduras eram pertences de relativo vulto, o que desestimulava a sua utilização em caminhos tão cheios de problemas. Assim, até o final do século XVII a utilização de cavalos e mulas na Capitania de São Paulo servia, sobretudo, a expedições breves feitas em áreas predominantemente formadas por descampados. Durante esse período o transporte de mercadorias, entre as diversas regiões de São Paulo, ficou a cargo dos indígenas administrados ou escravizados, que transportavam por longas distâncias cargas – em geral alimentos – que excediam os trinta quilos por carregador. Na maioria das vezes os carregadores eram do sexo masculino, o que em muitos casos acabava por subverter a lógica pré-cabralina das relações de trabalho dos nativos. 

As sociedades guarani, por exemplo, que foram as principais fornecedoras de mão-de-obra indígena aos colonos portugueses durante os século XVI e XVII, costumavam atribuir às mulheres a tarefa do transporte (Monteiro, 1995: 123-124). Se por um lado a utilização dos carregadores indígenas atenuava a necessidade da criação de um sistema viário mais aprimorado – condição essa imperativa para a locomoção com animais – por outro garantia aos colonos um transporte relativamente rápido e de baixo custo. Ainda sim, a maioria dos paulistas não contava com excedentes de mão-de-obra suficientes para manter um número satisfatório de índios de carga, o que tornava o aluguel de carregadores uma prática comum em São Paulo. O transporte indígena foi de fundamental importância para o desenvolvimento econômico de São Paulo, uma vez que sua relativa eficiência e baixo custo proporcionaram aos colonos que comercializassem os produtos agrícolas produzidos no planalto em circulação, como o milho, a mandioca, o feijão e, especialmente, a farinha de trigo. 

A importância dos carregadores indígenas se tornou tão patente que o transporte por eles encabeçado era um dos grandes demandantes de mão de obra indígena, capturada nas incursões de bandeirantes pelos sertões. Na época não foram raras as denúncias, sobretudo de jesuítas, em relação ao abuso cometido pelos colonos em relação à exploração da mão-de-obra indígena para o transporte de mercadorias (Monteiro, 1995: 124-126).

Os carregadores indígenas só foram substituídos sistematicamente pela locomoção animal com a abertura do “caminho do Sul”, que ligava Curitiba aos campos de Viamão e à colônia do Sacramento. A instalação de um sistema de comunicação que ligasse as áreas de criação de cavalos e muares às consumidoras foi facilitada pelas áreas de campos presentes no Brasil Meridional. Ao proporcionar um contato mais regular de São Paulo com os criadores de gado e castelhanos, a comunicação com o sul alterou significativamente o perfil da sociedade paulista, seja em termos econômicos – dada a inserção definitiva dos animais enquanto meio de transporte de carga – seja em termos culturais, como a incorporação da cuia de tomar congonha, do poncho azulado forrado de baeta vermelha e das atividades referentes ao manejo dos cavalos (Holanda, 2005: 129-130). 

O intitulado caminho do Sul, aberto em torno de 1733, foi majoritariamente organizado a partir do aproveitamento desses campos, que facilitavam a marcha do gado. Entretanto, o caminho do Sul não percorria apenas áreas de campos, já que esses se alternavam com extensas matas. A “estrada da mata” – que ligava Curralinho, ao Sul da Lapa, e Timbó, ao norte de Lajes – constituía um exemplo claro dos problemas de circulação na região. Deste modo, a abertura dos caminhos que ligaram os campos do Sul a São Paulo se deu em diversas etapas. Bartolomeu Pais de Abreu já solicitava, em 1720, a ligação entre o Rio Grande e São Paulo, alegando a importância desse empreendimento para o enriquecimento da Colônia. Posteriormente, homens como Francisco de Sousa Faria e Cristóvão Pereira de Abreu se destacaram na arregimentação de forças e grupos interessados na continuação da empreitada (Petrone, 1976). Pelo fato do elemento constitutivo do caminho do Sul ser formado pelos próprios campos da região, seu traçado sofreu poucas alterações ao longo do tempo, visto que a descrição da rota no século XVIII se assemelha muito com a caracterização feita por Pedro Muller (Muller, 1923), em 1836. Assim, as principais balizas do caminho do Sul no século XVIII eram Sorocaba, Itapetininga, Jaguariaíva, Castro, Carambeí, travessia do rio Iguaçu, Curralinho, campos de Curitiba, campos de Lajes, para, depois da travessia do rio Pelotas, seguir aos campos de Viamão e atravessar o rio das Antas e o das Camisas. 

A única diferença desse caminho para o descrito por Pedro Muller é que este indica uma bifurcação a partir de Lajes. Um dos atalhos seguia em direção aos campos de Vacaria; o outro atingia áreas mais a Leste, chegando aos campos de Viamão. Com a abundância cada vez maior dos cavalos e muares vindos dos campos sulinos, o carregador indígena viu-se substituído, gradativamente, pelas tropas de animais. Além disso, a escassez do braço indígena nesse momento já mostrava que sua utilização como transporte de mercadorias não era rentável quanto outrora. Direcionados em grande parte para a lavoura, os índios assistiram à ascensão de uma figura que se tornaria emblemática da sociedade paulista entre meados do século XVIII e as primeiras décadas do XIX: o tropeiro. 

A figura do tropeiro ainda não recebeu atenção merecida por parte da historiografia brasileira. Tratado geralmente de forma romantizada, depreciativa ou secundária, o tropeiro ocupou, na realidade, um lugar de destaque no desenvolvimento da América Portuguesa e do Império do Brasil, importância essa que só se arrefeceu com a chegada das estradas de ferro na segunda metade do século XIX. 

O tropeiro, em primeiro lugar, foi um elo essencial entre o mundo rural e urbano, já que nessa época as informações demoravam sensivelmente para se deslocar de um núcleo populacional para outro, principalmente quando serras, rios e obstáculos naturais dificultavam a mobilidade dos viajantes. Em segundo, devido a sua situação estratégica no mundo mercantil, os tropeiros desempenhavam um papel bastante importante para os proprietários interioranos, na medida em que traziam as novidades da situação econômica da Corte, funcionando, assim, como um tipo de conselheiro de negócios. Em terceiro, os tropeiros ajudaram a criar e consolidar caminhos fundamentais de ligação entre as diversas regiões pelas quais passavam. 

Segundo Sergio Buarque de Holanda (Holanda, 2005: 132-133), o tropeiro representa um amálgama de culturas, interesses e temporalidades, além de ter iniciado uma nova mediação entre a produção e sua comercialização: O tropeiro é o sucessor direto do sertanista e o precursor, em muitos, do grande fazendeiro. 

A transição faz-se assim sem violência. O espírito de aventura, que admite e quase exige a agressividade ou mesmo a fraude, encaminha-se, aos poucos, para uma ação mais disciplinadora. À fascinação dos riscos da ousadia turbulenta substitui-se o amor às iniciativas corajosas, mas que nem sempre dão imediato proveito. 

O amor da pecuária sucede ao gosto da rapina. Outra característica central dos tropeiros era a sua estreita relação com os setores produtivos junto aos quais ele desempenhava seus trabalhos. No caso daqueles vinculados aos gêneros de primeira necessidade, chega a ser difícil fazer uma distinção clara entre “proprietários” e “tropeiros”. 

As tropas de abastecimento eram muitas vezes compostas por familiares ou parentes dos próprios produtores da mercadoria transportada, o que estreitava ainda mais as relações entre esses grupos. Assim, um dos pontos de partida para uma compreensão mais apurada das tropas de abastecimento é conceber tropeiros e proprietários como setores socioeconômicos estritamente associados, mesmo porque, em São Paulo, não era o tropeiro mais abastado que se “aventurava” como proprietário, mas sim o contrário, resultando daí um desempenho maior no mercado em conseqüência desse amálgama de funções (Franco, 1983). 

Capão Bonito – Capão Bonito, por exemplo, foi entre fins do século XVIII e a primeira metade do século XIX uma importante “estação invernada” das tropas de reses e muares que, depois de percorrer mais de 50 léguas de Curitiba até os chamados campos de Faxina-Capão Bonito-Itapetininga, paravam tanto para alimentar, descansar e engordar os animais como para esperar preços convidativos dos compradores de Sorocaba, ou até mesmo condições propícias para a marcha (Petrone, 1976).

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